segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

[2009]

Esqueça todas as coisas extravagantes que fiz. Todas as palavras ditas no silêncio do meu olhar e todas aquelas outras escandalosas proclamadas à distância. Todas as lágrimas derramadas. Todo aquele batom vermelho borrado nos cantos da minha boca. Esqueça as coisas que não fiz também. Os sorrisos que não dei. As mãos que não apertei. Os abraços que adiei. As cartas que, embora tenha escrito, não mostrei. Esqueça o que acha que sabe porque, só agora vejo, há coisas que nem eu mesma sei. Estou virando as últimas páginas do ano de 2008 no livro da minha vida com uma única certeza, rabiscada com letra bonita numa folha amarelada pelo sal de outrora: nada do que aconteceu se compara ao que farei saltar da minha lista de desejos e se misturar, ardentemente, à porra que trago na boca e ao gozo que escapa pelos meus poros, sem meio nem fim, em 2009.

terça-feira, 23 de dezembro de 2008

[Pedido]

"Querido Papai Noel,

Não fui uma menina totalmente má neste ano de 2008 e, por causa disso, vou lhe fazer um pedido. Não, Papai Noel, não vou pedir para tentar entender 'por que é mais forte quem sabe mentir', como fiz daquela vez, lembra? Na verdade, sei que o que pedirei já chegou ao seu conhecimento no ano passado, só não entendi bem o porquê de não ter sido contemplada. Os muitos pedidos e sua idade deveras avançada, Bom Velhinho, me fizeram pensar que houve uma certa confusão na entrega dos presentes e, por isso, o meu chegou meio às avessas. Então, olhe, vou repetir: é para caprichar mais na falta de juízo. Um embrulho bonito, em papel vermelho sangue, carregado de falta de juízo para mim. E eu prometo fazer bom uso do meu presente durante o ano que vem inteirinho..."

quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

[Sobre Danças e Cavalgadas]

- Você continua naquele curso de dança do ventre, [P]?
- Sim.
- Está gostando?
- Estou.
- E acha que já está fazendo os movimentos de forma perfeita?
- Talvez.
- Você está tão calada hoje. Este não é o seu estado normal.
- Verdade.
- Se bem que você não se abre muito comigo, né?
- Né.
- Nós duas poderíamos ser tão amigas se você confiasse em mim, não acha?
- Não.
- Hahaha, como você é espirituosa!
- Sou?
- Bem, mas sabe por que estou perguntando sobre o seu curso de dança?
- Não.
- É que me disseram que a mulher que faz dança do ventre fica com muito mais remelexo na hora de... de...
- De?
- Ah, você sabe, né?
- Não.
- Puxa, [P]! Assim... dizem que a mulher que faz dança do ventre tem muito mais desenvoltura na hora da cavalgada, entende?
- Não.
- Duvido que não! Estou te perguntando porque se isto for mesmo verdade, vou querer fazer também. O que acha?
- Hum...
- Já pensou? Eu lá, cavalgando...
- Pangarés?
- Ah, lá vem você!
- Eu?
- Sim, lá vem você! Está pensando o que? Que é só estalar os dedos e um puro sangue aparecerá na sua frente, à espera da SUA cavalgada? Acha que sou como você?
- Não.
- Não mesmo, não sou como você. Prefiro cansar minhas pernas, entendeu?
- Hã?
- É isso aí, não venha posar de desentendida agora, [P]! Nunca vi alguém perder tantas oportunidades e nem sei pra que você inventou isso de dança do ventre, já que não é para cavalgar melhor, pelo visto.
- Acho desperdício de dinheiro.
- Hã? O que o dinheiro tem a ver com isso?
- Estou respondendo sua pergunta. Acho que sua matrícula num curso de dança do ventre é desperdício de dinheiro e tempo. Dinheiro que poderia ser gasto num spa e tempo que poderia ser utilizado para se manter longe de mim. Espelho, conhece? Vou te apresentar ao que existe lá no banheiro feminino e te fazer entender que, com este quadril, com estas coisas sobrando em cada um dos seus braços e com isto que está no lugar do que deveria ser uma barriga decente e que você faz questão de exibir em roupas de estilo duvidoso, enfim, com estes seus pré-requisitos, não me espanta que você tenha alguns pangarés aos seus pés de unhas mal feitas sem que, para isto, tenha que aprender dança do ventre. Você é um talento nato para cavalgadas. Eu não sou como você. Não me abro com você. Não pretendo ser sua amiga. E preciso me aperfeiçoar, certo? Você não, você é incrível! Longe de mim, bem distante, coisa de quilômetros para ser mais exata, então, me parece que atinge a perfeição.

["Sociabilidade". Acessório que guardo na minha bolsa e do qual só faço uso em casos de extrema necessidade]

segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

[Síndrome]

"Casa comigo que te faço a pessoa mais feliz do mundo. A mais linda, a mais amada, respeitada, cuidada... A mais bem comida. E a pessoa mais namorada do mundo e a mais casada. E a mais festas, viagens, jantares... Casa comigo que te faço a pessoa mais realizada profissionalmente. E a mais grávida e a mais mãe. E a pessoa mais as primeiras discussões. A pessoa mais novas brigas e as discussões de sempre. Casa comigo que te faço a pessoa mais separada do mundo. Te faço a pessoa mais solitária com um filho pra criar do mundo. A pessoa mais foi ao fundo do poço e dá a volta por cima de todas. A mais reconstruiu sua vida. A mais conheceu uma nova pessoa, a mais se apaixonou novamente... Casa comigo que te faço a pessoa mais 'casa comigo que te faço a pessoa mais feliz do mundo' "
[Michel Melamed, Regurgitofagia]

Caso contigo e te faço o homem mais feliz do mundo. Mesmo sabendo que sou muito mais mulher do que você é homem. Caso contigo e te faço não só o mais amado e respeitado... Caso contigo e te dou também o prazer de mais me comer. E de ser o mais namorado das redondezas e o mais bem casado. O mais festas, shows, cinemas... O mais realizado profissionalmente, ainda que não tenhas um emprego. Ainda que tenhas apenas sonhos. Caso contigo e com seus sonhos de uma cabana no meio do nada e uma menina mais parecida comigo correndo com os pés mais descalços. Caso contigo e te faço o mais pai de todos os possíveis pais que eu poderia escolher para a filha do meu ventre, a filha da mais mãe de todas as mães. Caso contigo e com seu mais conformismo em saber que sou a pessoa mais de todas as minhas discussões e das minhas brigas repetidas de sempre. Caso contigo mesmo sabendo que serei a mulher mais separada do mundo. Que terei nossa filha com o seu jeito mais tímido para criar mais sozinha no mundo. Caso contigo ainda que você me deixe mais no fundo do poço tempos depois. Ainda que me faças derramar mais rios de lágrimas. Caso contigo e te darei o consolo de ter sido casado com a que mais deu a volta por cima e mais reconstruiu sua vida. Caso contigo e te darei o prazer de ser o ex da que mais conheceu outra pessoa e mais se apaixonou torridamente... Caso contigo e te faço o homem mais "casa comigo que te faço o homem mais feliz do mundo".

Caso contigo, Bentinho. É só você pedir.

Beirut - Elephant Gun

quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

[Dos Descompassos]

Que tipo de mulher acha que vai conseguir sair de um carro com as mãos abarrotadas de coisas, de maneira impune? A mesma que faz com que uma meia calça se desmantele em não sei quantos fios puxados depois de se dar conta que não nasceu para ser acrobata? Que tipo de mulher supõe que vai conseguir forjar um momento-seu-consigo-mesma num estacionamento aparentemente vazio, a fim de arrancar a dita meia calça desmantelada daquelas pernas que não lhes pertencem sem que, contudo, tenha sua saga observada por olhares indiscretos? A mesma que leva a idéia adiante, deixa a porta entreaberta e se contorce em movimentos obscenos até, enfim, livrar-se daquele trapo antes de chegar, soberana, ao seu destino?

Eu sou uma mulher descompensada. É fato.

Agora, que tipo de homem finge-se de morto dentro de um carro supostamente vazio num estacionamento idem, a poucos metros do meu espetáculo de contorcionismo, e escolhe como instante para surgir do nada justamente aquele momento em que saio do carro e respiro aliviada, achando que ninguém, nem mesmo minha sombra, tinha visto aquela cena? O mesmo que acha graça de toda aquela descompensação em forma de pessoa que demonstrei ser e jura que vai estar à minha espera no final do expediente, para pagar uma meia calça nova? Que tipo de ser humano consegue se manter em silêncio enquanto uma estranha esbraveja sobre sua própria ingenuidade, sua descrença na raça masculina e a falta de educação de quem se presta a ficar escondido observando uma mulher em apuros dentro de um carro? O mesmo que espera meu monólogo terminar, estende um papel com um nome e um telefone, sorri abismadamente sem parar e diz que, quando eu quiser casar, é só avisar?

Um descompensado. É lógico.

Pensa bem: dois descompensados. Seria uma piada, provavelmente.

segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

[Se]

Se eu soubesse que seria assim, teria arremessado minhas insinuações com mais vigor sobre a mesa. Teria arrancado os botões daquela camisa com meus dentes. Teria ensinado o caminho reto e ligeiro que levaria as mãos a desembocarem no meio das minhas pernas. Teria cravado minhas unhas nas costas nuas com mais crueldade. Teria, por fim, derramado minha alma na boca aflita junto com meu gozo.

Ingênua que eu era, não previ que todas as minhas intenções encontrariam um freio nas mãos trêmulas, no tecido rendado e no barulho da multidão.

Acabei por me desfazer daquela calcinha de renda que só fez atrapalhar. Hoje ando sem. Ela. E você.

Se eu soubesse que seria assim, teria, por fim, derramado minha alma na boca aflita junto com meu gozo e meu te amo amordaçado.

quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

[Enigma]

Nem tudo são apenas erros de português ou linguagem internética, TAH? Nem tudo são declarações de amor ou preces desesperadas pelos pontos que faltam para alcançarem o Paraíso. Há também aquelas coisas que não se enquadram em nenhuma categoria pré-definida:

O que é isto, pessoas? Um ato de coragem diante do perigo imediato que é o enfretamento da ira dos pais? Um simples deboche da minha cara de surpresa diante de coisa tão estapafúrdia? Amor incondicional a esta que vos escreve, a ponto de abrir mão de férias antecipadas só para desfrutar da minha presença? Uma jogada suicida, tentando atingir a piedade que eu nem tenho, a fim de livrar-se da nota medonha? Ou loucura, pura e simplesmente, já que não ando lá muito sociável e qualquer gracinha me irrita profundamente?

sábado, 29 de novembro de 2008

["Eu Juro, Eu Te Amo Desde Que Eu Nasci"]

[O Ruivo. O que dispensa comentários]

["Está em cima com o céu e o luar, hora dos dias, semanas, meses, anos, décadas e séculos, milênios que vão passar..."]

["Eu não vou chorar, você não vai chorar; você pode entender que eu não vou mais te ver, por enquanto, sorria e saiba o que eu sei, eu te amo"]

[Porque eu pedi com jeitinho para que ele cantasse "E eu vou guiando, eu te espero, vem; siga aonde vão meus pés, porque eu te sigo também" olhando na minha direção]

["Eu cuidarei do seu jantar, do céu e do mar, e de você e de mim"]

[Oi, Carlos Pontual. Meu nome é [P], tenho um blog cujo nome é inspirado numa música do Ruivo e "não sei se o mundo é bão", mas você e Diogo Gameiro são, sim]

["Vem me ensinar a falar, vem me ensinar a ter você; na minha boca agora mora o teu nome, é a vista que os meus olhos querem ter; sem precisar procurar, nem descansar e adormecer..."]

["Eu só queria te contar que eu fui lá fora e vi dois sóis num dia, e a vida que ardia sem explicação..."]

[Está vendo o Ruivo de cabeça baixa? Foi logo depois que ele explicou que sempre prefere cantar aquela música ao ar livre, pois assim todos podem ver as estrelas. A canção é de uma estrela que, ele tem certeza, sempre se faz presente quando é tocada a sua canção. E então, enquanto os primeiros acordes eram iniciados, naquele momento em que ele está de cabeça baixa mesmo, começou a chover. E choveu durante All Star inteirinha. Quando ela terminou, em coro uníssono, a estrela parou de chorar sobre nós. De arrepiar. Mesmo]

[Porque uma [P]essoa vítima de alterações alcoólicas e duas doses de desdém com gelo consegue tirar fotos esquartejadas em ângulos estranhos. Isto sem falar no banho de chuva, nos pés descalços, na rouquidão e na aventura que é uma volta para casa pós-Ruivo...]

[Nando Reis e Os Infernais / Novembro de 2008]

quinta-feira, 27 de novembro de 2008

[A [P]ecadora]

Uma amiga contou sobre um tal calendário lançado pelo Vaticano cuja existência, aparentemente, apenas EU desconhecia. Então abro mão de todo o trabalho empilhado que me aguarda numa mesa igualmente abarrotada de porcarias comestíveis em prol desta notícia. Porque, como todos nós sabemos, devemos valorizar nosso bem-estar, nosso equilíbrio, nossa paz interior, ao invés de nos desdobrarmos em trabalho que, no final das contas, nos trará o que? Dinheiro? Quando traz, certo? E dinheiro não traz felicidade, irmãos. Dinheiro não é tudo e blábláblá.


Sim, Padres, eu pequei.
Devo confessar, na verdade, que sou pecadora compulsiva desde criancinha.
Onde exatamente devo ajoelhar para pagar minhas penitências infinitas antes de ir para o inferno de vez?

terça-feira, 25 de novembro de 2008

[O Outro]

Não gosto de pessoas ou coisas que se espalham intimamente, invadindo o meu espaço.

Percebendo que Luísa está fazendo exatamente isto, decidi que talvez fosse o momento de convidá-la, gentilmente, a se retirar do espaço dos Meus Pés.

Aí ela foi parar aqui: Luísa.

[Porque um único blog é pequeno demais para nós duas]

domingo, 23 de novembro de 2008

terça-feira, 18 de novembro de 2008

[Às Escuras]

- Eu só vim porque preciso dizer duas coisas - Luísa disparou enquanto olhava fixamente aquele par de olhos castanhos à sua frente.

Pensou em dar tempo para que uma nuvem de interrogação surgisse na sua frente. Pensou também em não dar chance para que ele esboçasse qualquer reação. Pensou que devia pensar com calma o próximo passo. Pensava atropelando o próprio raciocínio e acabou por ser interrompida em seu devaneio solitário:

- Considerando que já me disse uma frase, estou esperando a segunda coisa. Diga.

Por que ele tem que ser assim?, ela pensou. Mas se estava achando que sairia ileso, estava enganado. Luísa ajeitou o vestido enquanto via folhas caídas dançarem um balé descompassado aos seus pés e procurava perdida por entre papéis de bala e cuspes alheios no chão onde pisava a resposta ideal, a que ele merecia, a que não deixaria vão para réplicas. Dona das últimas palavras. Assim era ela.

Fred parecia impaciente, mas com paciência suficiente para assistir àquele precipitar de mãos, lábios e pensamentos. Gostava de provocar contrações sentimentais naquela que havia sido, até então, seu único ponto fraco em meio a uma coleção de quadris, coxas e sussurros. E Luísa nem sequer sabia desta sua fraqueza, ocupada demais que estava com seus brios, suas erupções escandalosas em vermelho sangue e seu caderno desbotado de versos e historinhas pueris. Por que ele tem que ser assim?, repetia a si mesma.

- E então? - ele insistiu.

Enxugou o excesso de furor das palavras decoradas na noite anterior. Aboliu as observações inúteis sobre o caráter daquele homem à sua frente. Encurtou o discurso melodramático a ponto de considerá-lo desnecessário naquele momento. De pé na frente de Fred e olhando bem no fundo dos seus olhos, ela disse apenas:

- Me coma.

Dona das últimas insinuações. Assim Luísa fazia questão de ser. Pensou em ajeitar o cabelo num coque parecido com o da fotografia desbotada da avó, já que ventava demais àquela hora da noite. Achou melhor abandonar os fios à própria sorte, pois viu que suas mãos seriam mais úteis segurando o vestido para que ele não descobrisse a nudez úmida do meio das suas pernas. Luísa era contraditoriamente recatada. Mesmo que o muro da igreja às escuras gritasse o contrário e mesmo que se visse obrigada a deixar Fred parado com seu desejo nas mãos, sozinho, sem olhar para trás.

Se fosse viva, talvez a avó pensasse ela tinha esquecido de notar que Fred não estava saciado. Esquecida, Luísa era. Mas, desta vez, ela só estava fazendo questão de ser inesquecível, a pobre.

sexta-feira, 14 de novembro de 2008

[Das Descobertas]

Ela estava sentada na beira da cama desarrumada há pelo menos uma hora. Já tinha tentado fumar, mas sem sucesso. Maldita mania aquela de seguir como se fosse uma puritana de igreja as decisões que concebia para si mesma, ora como passatempos fúteis, ora como um credo a ser entoado com louvor suficiente para que não caísse em tentação. Foi assim com a decisão de parar de fumar. Qualquer hora dessas ia inventar que devia parar de beber e andar com um coque igual ao da falecida avó. Se fosse viva, talvez se orgulhasse da total falta de jeito da neta para ser moça pudica. Sim, porque ela mesma, a avó, aprontara pelas noites da cidade noutros tempos. Se bem que, não, parar de beber ela não ia prometer mesmo. Não enquanto aquela garrafa de whisky continuasse a observá-la na mesa de cabeceira. Uma hora e meia, quase. E ela permanecia na mesma posição. Pernas cruzadas e rosto apoiado nas mãos, por sua vez apoiadas nas pernas despidas. Gostava de andar seminua pela casa quando estava só. Era como se o seu corpo lhe fizesse companhia e lhe bastasse quando estava irritada demais para aguentar gente. Gente sempre lhe causou uma certa aversão. Aversão às avessas, porque quanto mais queria se isolar, mais se aproximava de desgraças iminentes. Ela mesma, um vulcão prestes a entrar em erupção, avessa a contatos cheios de pormenores com gente. Ela mesma, uma despudorada enrustida se deixando atrair e levando para dentro de si o caos do mundo em forma de corpos suados e membros eretos. Ela sabia que era sua contradição que atraía. Usava-a, portanto, intencionalmente. Uma hora e quarenta e cinco minutos depois, pôs-se a andar pela casa. Achou melhor guardar aquela bebida que fitava-a com rancor. Ela era assim. Gostava de imaginar reações até mesmo em objetos de desejo. Achou bonito pensar que o gargalo da garrafa de whisky implorava pela sua língua em seus contornos. E assim pensou. Tomou apenas água gelada com a porta da geladeira aberta, para fazer inveja ao whisky excitado e para apaziguar o fogo que a consumia desde a noite anterior. E se ele estivesse à sua espera?







Luísa, enfim, desceu as escadas às pressas. Estava atrasada, para variar. Tanto tempo perdido sentada naquela cama. Tanta confusão de sentimentos a impedindo de escolher qualquer peça de roupa mais discreta que fosse. Lavou o rosto três vezes antes de decidir usar apenas um batom cor de boca mesmo, para que os olhos dos outros não se fixassem mais nos lábios carnudos do que nas palavras que eles poderiam proferir. Luísa gostava da expressão cor de boca. Sentia como se uma língua desenhasse sobre seu corpo a expressão cor de boca sempre que a pronunciava. Havia também cor de sexo. E cor de gozo. Escrevia com batom vermelho no canto do espelho do banheiro as expressões que não queria esquecer quando estivesse transando com o homem da sua vida, só para lembrar de caprichar nos matizes coloridos que derramaria sobre ele e sobre os lençóis.

Cumprimentou quem encontrou pelo caminho com um leve balançar de cabeça e, durante a caminhada até seu destino, achou por bem repetir a si mesma o seu discurso ensaiado. Não importava que pensassem que era louca por estar falando sozinha. Era mesmo louca. Falava mesmo sozinha. Sozinha. Eu só vim porque preciso dizer duas coisas, repetia com vigor. Modificava a entonação ao mesmo tempo em que ajeitava o cabelo esvoaçante, como se procurando combinar a fala perfeita com o semblante perfeito. Anoitecia e o vento aumentava. Luísa gostava do escuro. Mas não do vento. Apressou seus passos. Aumentou o tom da voz. Queria ouvir a si mesma. Enfim, chegou ao seu destino. E só então, num instante de calafrio provocado pela queda da temperatura e por um vento mais ousado, percebeu que tinha esquecido de colocar sua calcinha.






Assim era Luísa. Esquecida. E inesquecível. Como toda falsa inocente deve ser.

[Continua...]

segunda-feira, 10 de novembro de 2008

[Impressão - II]

"Falar com você me parece estar com um felino perigoso. Sei que corro riscos, mas gosto. Sei que é belo, mas perigoso. Sei que me conhece, mas respeito... Como uma pantera dócil. Que pode, quando eu me distrair, me pegar".

[Porque uma [P] não é feita somente de mente poluída. Existem também os ataques imprevistos, as oscilações de humor, o risco do perigo e uma certa docilidade em horas vagas]

terça-feira, 4 de novembro de 2008

[Prece]

I-n-f-e-r-n-o A-s-t-r-a-l.

Com um diferencial, em comparação aos outros anos: é um inferno astral regado a uma overdose musical, entende?

"Pai, afasta de mim este Jeff Buckley
Pai, afasta de mim este R.E.M
Pai, afasta de mim este Chico-olhos-cor-de-ardósia"

E tenha piedade dos que convivem comigo, porque sou capaz de chorar se alguém se aproximar e cantar O cravo brigou com a rosa na entonação correta...

[Prêmio Para Os Pés]

Welker, dono do Cesto de Lixo do qual sou assídua catadora de linhas inteligentes e autor dos comentários mais divertidos deixados por aqui, presenteou o blog com um selo, o "Prêmio Dardos":


(O prêmio Dardos tem como objetivo: "Reconhecer os valores que cada blogueiro mostra a cada dia, seu empenho por transmitir valores culturais, éticos, literários, pessoais, etc. Em suma, demonstram sua criatividade através do pensamento vivo que está e permanece intacto entre suas letras, entre suas palavras...". Para aceitar o selo deve-se citar e linkar o blog de quem recebeu, publicar a imagem do selo e repassar para mais 15 blogs.)

Parece que as pessoas obedientes que recebem este selo devem repassar o mesmo para mais quinze blogs, né? Mas... pára e pensa: eu, a [P], não posso dar mais do que dez. No bom sentido, claro. Portanto, vou incorporar a subversiva e indicar os seguintes blogs:

Clarice na Janela. É a janela onde gosto de perder horas vendo o compasso das suas linhas.

Pensamentos Soltos. Porque ela escreve sobre todos os assuntos com um toque pessoal que torna seus textos inconfundíveis. Além do mais, me aguentar, por si só, já mereceria um prêmio.

Love is no Big Truth. Ele nunca perde o jeito para escrever aqueles textos profundos que me cativaram há um bom tempo e sabe mesclar uma música que faz lembrar de mim com típicas cobranças de encurtamento de espaços geográficos, como se eu pudesse encolher o mapa do Brasil e torná-lo morador daquela esquina logo ali, sabe?

Dever cumprido. Agradeço aos meus pais, ao meu bom senso e ao Welker. Os responsáveis pela minha chegada a este mundo. O responsável pela minha vocação para ganhar a vida trabalhando como uma escrava ao invés de almejar ser a próxima capa da Playboy. E o responsável pela descrição sessão da tarde do Siga Aonde Vão Meus Pés e pelo presente para o blog.

sábado, 1 de novembro de 2008

[Impressão]

"A mente da [P] é praticamente um Tietê".

E pensar que alguém se jogou, se intoxicou, se afogou...

Felizes os que se agarram às frágeis cordas arremessadas facilmente de uma margem qualquer.

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Felizes?

segunda-feira, 27 de outubro de 2008

[Profissão [P]erigo]

Enquanto isso, nos Conselhos da vida...

- Turma tal? Quem é esse Fulano da turma tal?
- O que dorme em sala de aula.
- "M" passou na sua matéria?
- "M"? O que mandou a Dona Y tomar naquele lugar?
- Não!!! Estou falando do "M" abusado, não do outro, aquele com jeito de psicopata.
- Quem é Beltrano?
- O que se masturbou daquela vez.
- E Sicrano? Preciso ver a foto, não me lembro dele.
- É o que não se masturba, tadinho.
- Esse tal de "A" não é o que é apaixonado pela [P]?
- Não, esse é o que só quer comer a [P].
- Ah, é verdade! O que é apaixonado é "F", o funkeiro de piercing e vocabulário irritante, né?

Me-do!

[Discordo totalmente das pessoas que insinuam que o problema sou eu. Onde já se viu uma coisa dessas?]

E, por discordar delas, me limito apenas a assistir a toda aquela demonstração de habilidade que possuem na hora de traçar perfis.

Mas estou providenciando um "kit de trabalho ideal" que deverá conter, dentre outras coisas, um detector de ereções, um manual de auto ajuda para masturbadores iniciantes e um cinto de castidade fashion. Só por precaução, sabe?

sexta-feira, 24 de outubro de 2008

[Rubor]

O vermelho do meu rosto foi descoberto pela vergonha escancarada que deslizou pelas minhas pernas misturada à sua língua. Recolho às pressas o vestido caído aos seus pés. É minha frágil tentativa de esconder-te entre minhas pernas com o tecido ruborizado pela volúpia do meu desejo.

terça-feira, 21 de outubro de 2008

[Nota Mental - II]

Nunca, jamais, de forma nenhuma, em tempo algum, aceitar um convite aparentemente inofensivo para um churrasco em família, mas em família MESMO, onde estarão praticamente TODOS sorridentes e de bem com a vida, a ponto de desobedecerem as regras básicas de convivência pacífica comigo e colocarem, no último volume, uns versos que dizem assim:

"Te amo, mas vivo a fugir desse amor Não dá prá ficar cara a cara
Eu quero esquecer, mas se vejo você
Coração dispara [...]"


Porque vou sobreviver no começo e achar graça do desmiolado que ressuscitou os versos de um passado longínquo na minha carregada memória. No começo. Mas depois vou me dirigir a um cantinho discreto e, numa tentativa desesperada de não me deixar abalar, quem sabe começarei a dar murros no meu próprio rostinho, me chamando de anta e similares.

[E como a família estará praticamente TODA reunida, não terei privacidade suficiente para me autoflagelar em canto nenhum]

Então os peregrinos se encaminharão na minha direção.

Uma prima distante casada há séculos e mãe de quatro filhos me aconselhará a engravidar imediatamente, iniciando minha aventura rumo à escadinha da minha prole, às anestesias e ao povoamento desse mundo tão desabitado.

Uma tia vai me chamar num canto e perguntará se não seria melhor eu ir me confessar ao padre da família, só para tentar dar um jeito na minha situação. Porque de nada adianta se eu possuo nível superior e outros supérfluos altamente necessários na vida de qualquer ser humano a ponto de me manter independentemente de um homem, se ela não vê o homem em questão. Aquele que vai me fazer ficar quieta com a barriga encostada no fogão ou lavando com zelo suas roupas, nas palavras de titia.

[Não, ela não sabe que eu não tenho barriga. E também não sabe que possuo uma máquina de lavar bem potente]

Um primo vai explicar que possui n amigos e que, com certeza, um deles deve ser meu número. Que isso de sofrer por coisas sentimentais não está com nada. Que, em último caso, é só eu ir lá e, bem, enfim, você sabe, fazer o que é bom e todo mundo gosta.

Numa última tentativa de me arrancar confissões inconfessáveis, me oferecerão vinho. O ápice da preocupação com relação ao meu estado se dará quando alguém perceber que o problema é aquele som. Então, terão a magnifíca idéia de arranjar Smooth para tocar. Ninguém vai ter naquela casa, mas o vizinho tem e é gente boa, adora ajudar, etc e tal. Tudo em minha homenagem, claro.

Qualquer ser humano que me conheça minimamente sabe muito bem que, se eu bebo, não devo ouvir Smooth. Se ouço Smooth, não devo beber. É por aí o tamanho da desgraça.

[O resto é inconfessável. Como toda perda de juízo deve ser]

quinta-feira, 16 de outubro de 2008

[Propaganda]

- O que você tem hoje, [P]?
- Ah, não estou muito legal. Acho que já estou surtando. Preciso de férias.
- Surtando?
- É, surtando. Sabe o que eu fiz pela manhã?
- O que?
- Acordei atrasada e ainda estava sonolenta enquanto lavava o rosto. Peguei o sabonete líquido e senti um perfume diferente, sabe?
- Como assim?
- Um perfume que eu nunca tinha sentido antes, não daquele jeito. Mas que também não me pareceu assim tão estranho...
- [P], você está surtando mesmo!
- Espera! Então terminei de lavar o rosto e fui procurar a fórmula para tentar descobrir que cheiro era aquele.
- E?
- Era o sabonete íntimo. Eu disse que estava sonolenta...
- Hahahaha!
- Engraçado, né?
- É que onde você usa não dá para sentir com tanta intensidade!
- Olha a situação da [P]essoa surtada...
- Que nada! Você é esperta, menina!

Então ela foi compartilhar minha suposta esperteza numa sala repleta de colegas de trabalho:

- Genteeeeee! A [P] está prontinha pra um sexo oral básico!

Fuzilo com um olhar? Coloco meu pé na frente para que ela se esborrache no chão? Derrubo aquele copinho de água infame que ela carrega escadas acima sem querer? Incorporo a virgem envergonhada e enterro minha cara no chão? Assumo uma versão desinibida e pergunto quem vai ser o primeiro? Todas as alternativas anteriores?

quarta-feira, 15 de outubro de 2008

[Lição]

"São as pequenas coisas que valem mais..."



Sabe o que eu faço pela sala deles para ser tão amada e idolatrada, não sabe?

Eu poderia estar roubando, me drogando ou me prostituindo, mas faço de tudo um pouco para arrancar lan house, futebol, Playboy, MSN e shopping daquelas mentes, pelo menos por alguns minutos que sejam. Então subo na mesa, danço um bocado e tiro a roupa, enquanto faço meu trabalho honestamente.

Só assim, entende?

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É mentira, lógico.

Na verdade eu digo que não sou dentista para visualizar dentes. Que não sou mãe, irmã, tia, prima ou agregada para ouvir respostas desafiadoras. Que não sou fofoqueira, para saber historinhas de namoricos. Que tenho audição sensível, para ter que ouvir funk. Que não sou coleguinha, para ouvir gracejos. Que não sou terapeuta, para lidar com perturbações. Que sou só uma carrasca, que tira de sala quando a coisa beira o colapso total.

Mas faço tudo com jeitinho.

E é assim que cativo e ganho fã-clube, chocolates, pedidos de casamento, "você sabe que eu te amo, não sabe?" e papéis, muitos papéis...

terça-feira, 7 de outubro de 2008

[Por Hoje]

Vou te contar um segredo. Que ele fique somente entre nós dois e o vão obsceno que desvendará o vaivém dos nossos corpos. Cansei de ser racional. Quebre minhas verdades e espalhe-as misturadas a pétalas de rosa sobre os lençóis. Arranque das minhas entranhas os gritos sufocados pelas noites solitárias. Só por hoje eu permito que decidas por mim. Que me puxes pelos cabelos ao me ver aos seus pés. E que banhes minha pele com o suor do seu desejo. Só por hoje quero ser presa fácil. Deixe tatuada na minha cintura a marca das suas mãos. Crave seus dentes em meus mamilos. Me ensurdeça com seus gemidos. Faça de mim sua refeição. Prometo ser obediente. E estar quente. Prenda minhas pernas ao redor do seu corpo e não me deixes escapar da mesa da cozinha. Olhe nos meus olhos como jamais olhaste. Quero ler através deles os poemas que você fez para mim. Assista sobre mim o instante exato em que me levas ao céu. Afague meu coração com toques suaves. Morda minhas pernas com volúpia. Faça com que sua língua se perca nas minhas curvas. Vamos sujar a casa de sensações e gozo. Depressa. Tenho sede de viver. Vamos errar as contas, perder a hora e esquecer compromissos. Sorrir de tudo. Só por hoje. E, quem sabe, amanhã também.

sexta-feira, 3 de outubro de 2008

[Toda Tentação Será Perdoada - II]

No dia da matrícula uma moça muito simpática, toda guti-guti, meio pegajosa e cheia de nhém-nhém-nhém se viu na obrigação de fazer o seguinte comentário, após me ouvir dizer que estava apreensiva sobre se iria ou não aprender tudo direito e, principalmente, gostar da coisa e ver na dança a finalidade que procuro:

- Ah, mas é claro que você vai gostar, meu bem! Em pouco tempo vai estar enlouquecendo até um poste, você vai ver.

Quanta perspicácia a mocinha possui, não?

Porque, não sei quanto a você, mas a minha verdadeira intenção, ao iniciar um curso de dança do ventre, é passar por uma calçada deserta, tarde da noite, me insinuar para um poste e deixá-lo duro de tesão por mim, meu bem.

sexta-feira, 26 de setembro de 2008

[Toda Tentação Será Perdoada]

Outro dia uma menina me chamou na sua mesa e perguntou, baixinho, se eu estava grávida.

Todas as pessoas para as quais contei o ocorrido disseram que era impossível que tivessem feito tal pergunta para mim.

Mas foi o suficiente, no meu entender. Encarei a perguntinha como uma revelação.

Era o sinal dos céus que faltava para que eu criasse vergonha na cara e começasse a fazer alguma atividade física diferente de levantamento de canetas vermelhas.

Resolvi me matricular num curso de dança do ventre.

Pois é.

Sem perguntas, por favor.

[Porque tentação pouca é bobagem]

segunda-feira, 22 de setembro de 2008

[Momento-Desabafo]

Querido Diário,

Foi com grande satisfação que hoje eu ouvi um "nossa, eu ia ter medo de trabalhar contigo. você fala tudo na cara das pessoas, né? eu ia morrer de medo de ter que te enfrentar".

"Né". Eu falo tudo na cara das pessoas. Às vezes saio vomitando o que luta comigo para manter-se dentro desta minha boca sem pensar em hora, interlocutora surda, conjunção astral e demais fatores. Sigo meu caminho imaginando que, a qualquer momento, encontrarei uma pessoa tão petulante quanto eu - o que, certamente, me encheria de tesão -, ao invés das criaturas desprovidas de neurônios bons de briga com as quais sou obrigada a lidar.

Enquanto isso não acontece, preciso desabafar.

"Vai ser bem resolvida, bem paga, bem amada, bem maquiada, bem comida e bem pobre de espírito no raio que a parta, entendeu?"

Pronto. Precisava de um desabafo escrito, após um desabafo explícito no rosto de quem, minutos depois, me disse um "ah, mas como você é espirituosa, P! um dia quero ser igualzinha a você".

[Inimigas fracas, tsc! Detesto]

sexta-feira, 19 de setembro de 2008

[Salvação]

Eu passaria horas intermináveis transbordando meu oceano de desejos sobre ti, só para poder sentir teus cílios afogados entre meus seios enquanto te salvo de mim.

quarta-feira, 17 de setembro de 2008

[Mimo]

Duas vezes por semana tenho meus cinco minutos de fama. É mais ou menos o tempo que levo desde o instante em que apareço na porta daquela sala até conseguir alcançar minha mesa. Os autógrafos restringem-se às notas que sou obrigada a dar a cada uma daquelas tietes que sonham em ser como eu quando crescer: querem meu bom gosto na hora de escolher minhas blusas, minha insanidade nos momentos em que não resisto às vitrines da vida, a potência dos meus gritos e - por que não? - as desventuras do meu pobre coração.

[É um pacote. Vai tudo junto. Os infortúnios são os brindes que a vida me oferece]

Uma delas, uma vez, me confidenciou que precisava desabafar. Estava visivelmente preocupada com uma suposta doença da sua avó. Perguntou se poderia conversar comigo e eu, um ser altamente vulnerável a um precisava conversar, você poderia me ouvir?, acabei consolando-a. Tempos depois ela disse que havia me escolhido porque sou a mais carinhosa dentre todas as pessoas que lidam com eles. Diante do meu espanto, acompanhado de um "eu sou?", ela explicou que "sim, é. a senhora não sabia?", numa demonstração de espanto recíproco.

Porque não fazia muito tempo eu tinha dado um sermão generalizado, chamando a atenção, principalmente, para a falta de educação de todos daquela sala, que me impedia de terminar um raciocínio sem que fosse interrompida, seja por perguntas, piadas ou outra gracinha qualquer. Porque, lembro bem, terminei meu sermão com uma observação direcionada às tietes: "vocês são uns amores na forma como me tratam, mas terrivelmente ridículas nessa mania de me atrapalhar nas horas impróprias". Se sou a mais carinhosa, imagino o que acontece entre aquelas quatro paredes quando não sou eu quem está no comando.

Então elas me apareceram com um mimo coletivo, que foi deixado sobre minha mesa e no qual se lia:

A declaração estava acompanhada da edificante observação:

Forma meio às avessas de demonstrar carinho. Talvez tenham aprendido comigo. Seria este o momento exato de ir ali e tentar me matar?

[É porque, no fundo, sou uma boa moça, sabe? Se eu fosse uma "imitação de vingativa"...]

quinta-feira, 11 de setembro de 2008

[Confissões]

Tudo começou quando você me pediu para que eu não escrevesse mais sobre nós dois. Era uma noite sem luar e na rádio da casa da vizinha, do outro lado da rua, tocava qualquer coisa brega demais para impulsionar meu ímpeto radical de desobediência. Naquela noite eu tinha decidido mudar. E obedecer. Tentaria roteiros lacrimejantes, histórias de comercial de margarina, chutes meteorológicos ou previsões para nossos signos baseadas unicamente na minha vontade de trepar com você. Tudo, menos nós dois. O tombo que levei ao tropeçar no tapete daquela sala lotada. Acho que até viram minha lingerie. Os palavrões que escapuliram da minha boca quando o motorista de um ônibus ameaçou ensopar minha roupa com a lama de uma poça qualquer na manhã seguinte ao seu eu não quero mais. Tudo, menos nós dois. Comecei a rabiscar as besteiras dos dias insólitos em papéis de pão, na contracapa dos nossos livros, distraidamente na minha mesa, nos cadernos alheios e no espelho do banheiro.

Foi quando me dei conta de que a ausência de minhas cores me consumia e que o excesso de bobagens espalhadas pelo chão do apartamento vazio estava me sufocando. Juro, eu juro que tentei encontrar os pedaços das letras ingênuas e obedientes que escrevi, envoltas em nuvenzinhas e corações despretensiosos, só que eles se perderam, talvez misturados à lembrança do seu suspiro que, eu também juro, ainda ecoa pelas paredes. Mas também não faz mal. Porque se eram sobre tudo, menos nós dois, não tinham grande importância: o tombo que não existiu, os palavrões que não falei, as previsões que errei e as lágrimas que fiz a mocinha derramar no dia em que fugiu com o herói da história.

Preciso confessar. Regredi. Sou uma fraca. Uma covarde. Uma submissa das entrelinhas. Você não sabe, mas te escrevo às escondidas os textos mais escandalosos que consigo parir. É meu vício. Sou dependente do ato de dar à luz meus anseios em forma de palavras. É, eu sei. Havia prometido parar, mas é mais forte. E como se não bastasse escrever, um belo dia decidi que precisava compartilhar.

Agora faço assim: escrevo entre sangue e placenta, entre sorrisos e lágrimas, escondo meus versos na minha bolsa como se estivesse enrolando-os numa manta e os carrego, sorrateiramente, para meu armário. Espero o momento ideal, colo a folha rabiscada do lado de dentro da porta e mostro os nossos textos para as meninas que não sabem esconder o tom vermelho dos seus rostos quando lêem o que gostariam de dizer.

Foi assim que entrei para o submundo dos textos. Cada vez que os mostro, aparece uma dizendo que precisa entregar aquelas linhas para alguém, com aspas e citando a autora, claro. Imagine, nossos textos! Em troca de vodka, piadas, waffer de chocolate e sorvete de morango. Acho que já desfizemos casamentos, humilhamos ao extremo e, em maior escala, provocamos orgasmos por aí.

Estou pensando numa especialização às pressas. Quero ajudar a trazer a pessoa amada em poucos dias. Não você. A pessoa amada de outras pessoas. Portanto, esqueça o pedido de perdão que me fez com a voz rouca naquela tarde ensolarada. Estou ocupada demais me mostrando a quem está disposto a me despir letra por letra, no meio dos textos que fiz só para você.

domingo, 7 de setembro de 2008

[Banquete]

Quero me virar do avesso só para você. Quero que me desejes com os olhos antes de encostar no meu corpo o seu sexo sedento. Vou aos poucos expondo minhas feridas misturadas aos meus órgãos sobre o lençol bagunçado da sua cama. Quero que você me coma aos pedaços e me mastigue entre seus dentes tantas vezes quantas forem necessárias para que percebas que não vou me desfazer por ti. Quero ser inteira porque te quero inteiro. Preciso ser inteira porque te quero inteiro aqui em mim. Quero que você arranque meus pedaços magoados e guarde-os embaixo do colchão. Vou lamber seu desejo escorrendo pelos meus lábios enquanto salivas pelas fatias de mim. Vou me banhar no seu suor e impregnar sua língua com meu cheiro. Derramarei minha alma no seu corpo nu até que estejas farto de tanto amor. Então você vai caminhar lentamente em direção à cômoda, pegará nossos corações, até então colados um no outro, e os recolocará nos seus lugares, com a mesma mão que me despiu, me tocou, me atravessou e me incendiou. Só farei questão do meu coração, intacto. E adormecerás com o rosto sobre meu ventre e os pés tocando as estrelas.

sábado, 6 de setembro de 2008

[Salve, Jorge]

Pensemos num cidadão com o poder de tirar qualquer pessoa da cadeira - tias e tios, inclusive.

Acrescentemos que ele é o mesmo que protagoniza aquela tórrida cena de sexo naquele filme, sabe qual?

Coloquemos o homem na minha frente para ver o tamanho do estrago...





























E então a [P]essoa vai dormir feliz da vida. Com os pés doendo, depois de ter dançado por três horas seguidas, mas feliz da vida.

quarta-feira, 3 de setembro de 2008

[Nota Mental]

Nunca, jamais, de forma nenhuma, em tempo algum, permitir que uma pirralha metida a adulta presencie o meu processo de superprodução para uma saída qualquer, principalmente se ela quiser participar de todo o negócio como aprendiz desde o momento em que entra no recinto e me vê usando apenas duas peças íntimas.

Porque quando tudo estiver terminado e eu me olhar no espelho, perguntando "e então?", terei que ouvir, como triste manifestação de uma irônica amnésia, um...

- Você está linda! Mas... por que não aproveita agora para vestir uma calcinha antes de sair?

sábado, 30 de agosto de 2008

[Influência]

Uma amiga foi chamada na escola onde sua filha estuda e entrou em desespero, se perguntando o que a menina poderia ter aprontado e convencendo-se, minutos depois, de que na verdade ela não devia ter aprontado nada, mas sim teria sido vítima de algum coleguinha.

[Invejo a facilidade com que algumas pessoas conseguem converter pensamentos negativos em flores, bombons e serotonina]

Lá foi ela no dia marcado pela professora e, pouco tempo depois, bateu na minha porta, dizendo que havia um engano e que era EU quem deveria ter sido chamada.

- A professora dela quer conversar COM VOCÊ. Pode ser hoje, se tiver tempo livre. Tenho CERTEZA que você tem uns minutos livres, não é, [P]?

Você me pergunta o que eu tinha a ver com a filha dela. Bem. Então. Assim... a menina andou cantando sexo verbal não faz meu estilo durante umas aulinhas e, nós sabemos, num lugar possuído pela força dominadora do funk, dizer que sexo verbal não faz o seu estilo transforma a pequena num ser humano com alto poder destrutivo, capaz de corromper primeiramente seus coleguinhas de classe e, posteriormente, as outras turmas, a escola inteira e, quem sabe, todo o planeta.

[Adivinha com quem ela ouve "Eu Sei"?]

Está certo que ela só tem três aninhos. Quase quatro, se é que isto melhora um pouco minha situação.

Mas isso não tira o meu mérito, concorda?

[Uma vez Bem Intencionada, sempre Bem Intencionada...]

quarta-feira, 27 de agosto de 2008

["Porque Eu Te Sigo Também"]



["Luz dos Olhos" está entre as coisas que considero mais lindas nesta vida. Eu abriria mão de uma marcha nupcial só para ver um ponho os meus olhos em você, se você está; dona dos meus olhos é você; os meus olhos vidram ao te ver traduzido no rosto do lunático de quem estaria à minha espera]