domingo, 23 de maio de 2010

[Fila]

- Olha, moça, mesmo com o pouco tempo, já deu pra notar que você não tem o menor senso de humor, é antipática, deve ser jogada sempre pra escanteio, além de não ter um pingo de inteligência. Pra completar, é feia pra caralho. Acho que o capeta deve morrer de medo toda vez que você levanta da cama mas, mesmo assim, eu me casaria contigo.

Assim, só para esclarecer: pouco tempo = alguns minutos que eu e uma amiga ficamos numa fila, conversando distraidamente, sem sequer imaginarmos que prestavam atenção no nosso bizarro diálogo.

[Também acho válido explicar que se tratava de um açougueiro. E que havia um facão em cena. E que eu achei melhor não reagir]

terça-feira, 18 de maio de 2010

[O E-mail]

Problemática, uma das três estranhas criaturas que eu chamo, por motivos de força maior, de meus estagiários, todatodatoda constrangida pediu licença para falar comigo no final do expediente.

- Recebi seu e-mail, [P]. Segundaintencao@gmail.com. SEU e-mail, [P].

[Problemática, em função da sua carência sexual, é sucinta. Demais. Acho que ela tem medo de utilizar muitas letras, acabar formando várias palavras, ter um colapso gramatical e chegar a um orgasmo involuntário, é isso]

Ao perceber que sua aflição não estava ligada às coisas que eu tinha pedido para que fizesse, mas sim ao endereço de e-mail que, por engano, utilizei para enviar a mensagem, a primeira coisa que me veio à mente - sim, porque eu sou aquela que pensa em mil coisas e, no final das contas, escolhe algo que nem sequer tinha imaginado - foi:

- Criei este e-mail especialmente para você, veja que honra! Foi a maneira indireta mais delicada que encontrei para dizer que, colega, você precisa dar. E dar urgentemente, se liga. Dê. Para o primeiro que topar receber. Você precisa, fofa.

[Nada como duplicar as besteiras que fazemos em nosso dia-a-dia, não é verdade?]

terça-feira, 11 de maio de 2010

[De Nós Dois]

[Ele me encostou na parede e enfiou sua língua dentro da minha boca, me obrigando a entregar as palavras que nem estavam prontas para serem ditas. Segurou com uma das mãos o meu cabelo e com a outra a minha cintura, enquanto mordia minhas sílabas e engasgava com meus acentos bagunçados debaixo da roupa. Lambeu meus parágrafos com a sede dos inocentes que se afogam enquanto viram minhas páginas amassadas de histórias de amor desbotadas. Foi embora tão atordoado quanto eu, levando consigo minhas frases feitas embrulhadas na calcinha que arrancou com os dentes, acho que para não deixá-las escapar. Ele só não sabe que guardei os rascunhos de nós dois. Ele só não sabe ainda que vai querer voltar]

quinta-feira, 6 de maio de 2010

[O Vizinho]

Eu tenho um vizinho.

[Eu sei, você também tem, né?]

Este meu vizinho é o marido desta vizinha, a de proporções gigantescas e lentidão ímpar. O meu vizinho, ao contrário da esposa, não possui um tamanho descomunal mas ostenta uma barriga que, associada ao tamanho da mulher, deve fazer do ato sexual algo próximo ao bizarro.

[Sim, este é um post-desabafo e se você não curte meus surtos, é lamentável, pois eu surto b.o.n.i.t.o]

E por que meu vizinho num post? Porque o território brasileiro está pequeno demais para nós dois, imagine. Só fiz questão de vir aqui descarregar todo este excesso de fúria comunicar que, caso eu desapareça de repente, foi ele. E, veja bem meu bem, não quero dizer com isto que ele me sequestrou, me violentou e depois me matou com requintes de crueldade. Claro que esta é uma possibilidade. Porém, eu também posso estar foragida ou então presa numa cela à espera de um habeas corpus, entendeu? Ou seja, foi ele, do mesmo jeito. Ele, cujas atitudes culminaram, recentemente, em tórridas discussões entre nós dois.

[Não entraremos no mérito do que está acontecendo há alguns meses porque, né?, vamos evitar a fadiga. Vou me limitar a explicar que t.o.d.o ser humano que está a par dos acontecimentos e das atitudes dele concorda comigo. Ou todo mundo enlouqueceu e resolveu me apoiar incondicionalmente ou, de fato, é ele. E É ele, você também não concorda?]

O fato é que estou preocupada com as pessoas que estão preocupadas comigo. Algo parecido com uma corrente da preocupação está unindo quem me cerca, independente de sexo, idade e grau de parentesco. Genitor, por exemplo, lidera o grupo dos que já começaram a fazer orações, promessas e mandingas para que eu deixe isso para lá - justamente Genitor, de quem herdei este sangue que borbulha em minhas veias.

Cada vez que me olho no espelho, que penso no que me tornei, no que consegui por mérito próprio e comparo com meu vizinho, é praticamente um estado de choque constatar que eu não precisava, sabe? Discutir com quem do nada veio e para o nada caminha, com quem não concluiu o ensino fundamental por pura preguiça de estudar, com quem vem se mostrando tão mesquinho, tão arrogante, tão presunçoso a ponto de me provocar pena. Afinal, eu sou a pós-graduada nesta história, a que paga suas próprias contas, a que é respeitada no trabalho pelo tanto que se esforça em dar o melhor de si.

[Não, não vamos também comentar o fato do meu tamanho não ser algo sobrenatural tal qual o da sua esposa, nem tampouco as outras diferenças gritantes entre nós duas, ok?]

Gostaria de ser uma pessoa evoluída espiritualmente a ponto de ignorar certas coisas, mas ainda estou um pouco distante disto na minha escala particular da evolução humana, de modo que, nas duas únicas discussões que tivemos - estamos fingindo que não nos conhecemos quando nos cruzamos pelas ruas - eu consegui, depois de argumentar brilhantemente, soltar o seguinte:

- Se você gosta de fazer sacanagem com as pessoas, que vá fazer sacanagem com o rabo da sua mãe.

E...

- Se você ousar arranhar o meu carro, vai ter que tirar dinheiro do rabo, quem sabe dando o seu cu, para pagar o estrago.

...

...

...

Aham.

Eu.

Graduação.

Pós-Graduação.

Cabelo comprovadamente bom.

Corpo de tamanho visivelmente normal.

Dona do meu próprio nariz.

Aham.

Sim, eu.

Abusada.

Falei. Falei mesmo.

Só me arrependo de ter insistido na coisa do rabo, é óbvio. Meu vocabulário é tão vasto, podia ter variado, sei disso.

[Pessoas preocupadas porque o Brasil está pequeno demais para nós dois. Entendeu agora?]

segunda-feira, 3 de maio de 2010

[Suposições]

Você é uma pessoa distinta e respeitada no seu local de trabalho. Não perde a ternura, mas endurece quando necessário - o que lhe rendeu recentemente, entre os colegas, o carinhoso apelido de [P]-Chapa-Quente.

Dito isto, suponhamos que você, como pessoa distinta, respeitada e doce, precise utilizar mais de um email na sua vida. Suponhamos que esta necessidade venha do fato de você possuir um blog que é desconhecido no tal local de trabalho. Assim sendo, suponhamos - veja bem, é apenas uma leve suposição - que, após um momento perturbadamente etílico da sua vida, você tenha lembrado que precisava enviar coisas urgentes a uma coleguinha de trabalho. Suponhamos que a sua pessoa, acometida por uma pressa transcendental, tenha resolvido enviar as coisas urgentes e, só depois de ter feito isto, percebeu que utilizou o email do tal blog secreto.

Suponhamos - não esqueça, é só uma suposição - que o endereço de email utilizado tenha sido segundaintencao@gmail.com.

Você - estamos apenas supondo, claro -, que é uma pessoa distinta, respeitada e doce em seu local de trabalho, depois do estrago feito, pensaria exatamente o que?

[Não vale você está fodida, ok? Suponhamos que isto foi a primeira coisa que me veio à cabeça...]