Ver meus parentes confabulando sobre minha idade é uma das coisas que mais me dão prazer nesta vida. Chocolate. Língua. Sorvete de morango. Divagações dos meus parentes sobre minha idade. Smooth. Cinco coisas que deixam a [P] em estado de graça, anote aí.
- Com quantos anos a [P] deve estar agora? - meu tio pergunta, como se não nos víssemos desde nossas últimas encarnações.
- Ah, ela deve estar com vinte e cinco, vinte e seis - responde minha madrinha.
[Veja bem: minha m.a.d.r.i.n.h.a não sabe a minha real idade, coisa mais meiga]
- Não, não... A [P] foi dama de honra do nosso casamento com quatro anos, não foi? Não temos quase isso de casados? - rebate meu tio.
- É mesmo!
- Então ela deve ter uns vinte e um, vinte e dois...
E é neste momento que eu apareço, interrompo a conversa e digo que está ótimo, que concordo com eles, só posso ter isso mesmo, nada mais nada menos e que fechamos em vinte e dois numa boa.
Como recompensa por ser uma boa menina e não questionar a minha verdadeira idade, Madrinha abre sua bolsa, diz que esteve num lugar onde se vendem roupas íntimas de qualidade a preços baixos e que, ora, havia lembrado de mim. Pensei comigo mesma se devia abrir o presente na frente de todos, porque não sou muito ortodoxa com relação a certas coisas e se de repente ela tivesse notado o meu gosto para coisas não muito ortodoxas, não é verdade?
Depois da insistência, abri, confundi a peça com um short e respondi que era tão... tão... tão... grande, para espanto geral dos que viam a imagem de mocinha pudica se desmanchar antes da partida de futebol que os homens da família tanto haviam se esmerado em organizar. Eu me senti mal, né? Estraguei o espírito animado de todos antes mesmo do jogo começar. Como os homens da família que até então me desenhavam envolta em nuvenzinhas celestiais trajando um vestidinho de motivos florais iriam se concentrar e correr atrás da bola direito, não? Tentei consertar dizendo que ainda bem que tem aquele wonderland escrito na calcinha, porque se não fosse aquilo eu não teria como usar, mas aquele wonderland é t.u.d.o., que sempre desejei sair com uma calcinha onde se lê wonderland, que isso deve dar uma sensação descomunal de prazer àquele que for deslizar suas mãos pela minhas pernas e dar de cara com um wonderland cobrindo minhas partes íntimas e blabláblá.
[É excelente a aptidão que manifesto ao tentar consertar minhas próprias confusões, reparemos bem]
Eles entenderam. Todos entenderam. Todos menos eu, que me pergunto como, céus, como faço parte desta família? Mas meu tio ficou feliz por ser bom em Matemática, Madrinha ficou feliz porque elogiei a calcinha wonderland, eu fiquei feliz por mais uma encenação de êxito na minha vida, as vendedoras ficam felizes por ganharem comissão sobre os vestidos que meus vinte e dois anos me permitem usar e os meninos ficam felizes por me verem rindo das suas abordagens estapafúrdias. Um mundo feliz ao meu redor, no final das contas...