quinta-feira, 19 de março de 2009

[Dos [P]oderes]

Em novembro do ano passado anunciei que ia deixar um dos meus 2645470912 empregos. Tão logo a notícia se espalhou virei refém de minhas próprias palavras e não podia dar um passo sem que visse manifestações de repúdio ao sistema opressor e à minha decisão que, de acordo com o discurso de todos, era tão somente a inviabilidade de continuar respirando e trabalhando em 2645470912 lugares. Elaboraram um manifesto, colheram assinaturas, citaram Marx, prepararam barricadas e sublevaram até mesmo as crianças de três, quatro, cinco anos a participarem de atos em favor da minha permanência, alegando que elas estariam fadadas a passar pelas suas vidas sem terem tido a chance de me ouvirem entre as quatro paredes do saber. A coisa foi tomando uma proporção tão grande que reuniões extraordinárias de pais, responsáveis, orientadoras, diretores, mães de santo, adivinhadores e amigas anônimas eram convocadas sem que eu tivesse tempo de pensar em não repetir as roupas e mal dando conta dos discursos elaborados nas vésperas das coletivas.

No final de dois meses propuseram que eu ficasse com a coordenação. C.o.o.r.d.e.n.a.ç.ã.o. Eu. A descompensada que arranca uma meia calça rasgada dentro de um carro num estacionamento supostamente vazio e só depois descobre que estava sendo observada. Eu. A mulher que corta o próprio cabelo, junta tudo numa sacola e joga no lixo do vizinho. Eu. A que sobe em mesas embrulhada numa toalha de banho e esquece que o compartilhamento de chaves existe e pode se fazer presente antes que a música termine. Eu. Aquela dos destemperos ululantes. C.o.o.r.d.e.n.a.n.d.o.

Argumentei que não sirvo para coordenar nem mesmo a direção das minhas lágrimas, nem o volume dos meus xingamentos, nem a quantidade de linhas dos textos que produzo e nem o rumo que minha imaginação consegue tomar à minha revelia. As pessoas daquele lugar fingiram-se de surdas, recusaram-se a abrir os portões e, para não ter que morar lá, recuei. Ninguém falou em diminuir meu tempo e aumentar meu salário, mas recuei do mesmo jeito. Não sabia bem o motivo, que só ficou mais claro de uns tempos para cá.

Nasci para coordenar. Também nasci para fazer o que faço e faço porque gosto, que fique claro. Mas descobri que coordenar é terapêutico. Não, eu não sou uma ditadora enrustida que se nega a ouvir críticas, elogios, firulas, problemas matrimoniais e horóscopo do dia. Ouço tudo, sou boa ouvinte, juro. Travamos altos debates e me recuso a sair das reuniões sem que as devidas decisões tenham sido tomadas, talvez devido ao trauma de toda uma vida como participante de reuniões que discutiam apenas o sexo dos anjos e acabavam em nada. Dou direito a réplicas, tréplicas e o que mais seja necessário. O problema é que Direção confia plenamente em mim [sim, na descompensada] e a palavra final é sempre a minha, entende? O perigo mora justamente aí: sentar na cabeceira daquela mesa imensa, ser o centro das atenções e dar o aval ou a recusa do que está por vir.

Já andei pensando, inclusive, numas botas com saltos estratégicos e um chicote, para pôr em prática minhas fantasias. Isto porque é só uma Coordenação. Ah, uma Direção nas minhas mãos...

[Sabe aquele ditado que diz que o Todo Poderoso não dá asas a cobras? Está explicado...]

4 comentários:

  1. Eu sempre te acehi[P]oderosa, talvez agora todo o [P]oder que emana de você, posso ajudar aos mais necessitados.(risos!) De uma coisa eu tenho certeza, o mundo do poder seria muito melhor se houvesse mais pessoas como você por lá.
    beijos poderosos

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  2. Não sei se digo parabéns ou se fico com pena do pessoal que está sob seu jugo. he he he he

    Ósculos

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  3. E quem não gosta do gostinho do poder?
    Saudade bela!
    Um dia dominaremos o mundo! rs

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[Suas Pegadas]