sexta-feira, 19 de novembro de 2010

["In The Dark Of Night"]

[Achei a toalha ainda molhada e com o seu cheiro de shampoo barato, perdida no meio dos versos daquela poesia tosca que eu pensava ser a mais bonita que escrevi, num janeiro calorento de anos atrás. Encontro sua toalha e nela me escondo; e quando enxugas teu rosto, sou eu que te beijo, você lembra? É claro que não se lembra. Suas lembranças de nós dois ficaram encaixotadas em algum canto escuro e mofado da sua memória. Também me desfiz de você. Sabe como é, não sabe? Você era somente o então grande amor da minha vida, não podia te carregar entre os seios eternamente. Foi assim que dobrei em pedaços tão pequenos quanto a pequenez dos seus gestos todos os desejos que mantive aprisionados entre minhas pernas e mais outros tantos que deixei escapar junto com minha saliva misturada à sua em noites regadas a álcool e estrelas cadentes. Dobrei e guardei todos eles entre as capas dos discos de vinil que colecionávamos juntos e que acabei de rasgar, uma a uma, sentada no tapete da sala à meia luz e ao som de Sweet Child of Mine, em sua homenagem. Lembra dos poderes telepáticos que dizia ter e todo aquele papo furado sobre sentir a minha raiva junto comigo? Nunca acreditei. Fazia cara de virgem indefesa e inocente porque gostava de rir da sua ingenuidade quando achava que me enganava com historinhas pueris. Você não sabia nem sentir, imagine sentir a minha raiva. Quem você pensava que era? Devia sentir o frio que estou sentindo agora enquanto rasgo What's Going On só de calcinha, com uma caneca de chocolate quente ao lado e uma imagem patética sua, daquelas que você caprichou em fazer para deixar registrada na minha memória. Eu queria rir do seu cabelo sem graça e dizer que os anos te fizeram mal. Eu queria explicar que aquela mochila surrada não estava combinando com suas roupas. Eu queria te dar um tapa na cara para cada uma das lágrimas que derramei dentro de copos com gelo. E você estragou tudo quando falou da porra da sua vida, do clima ameno e das últimas manchetes, do mesmo jeito que estragou tudo naquela noite em que te apontei uma constelação e você não soube dizer qual era, preocupado que estava em levantar meu vestido junto àquele muro. Deixa eu te contar uma coisa. Abandonei a falsa inocência pelo caminho. Joguei-a do oitavo andar quando estava na faculdade, aquela pedante que teimava em cegar meus olhos. Desde então carrego comigo a devassa que morde os lábios enquanto fala e geme com os olhos enquanto cala. By my side ainda ecoa no meu ouvido, mesmo estando longe da pista de dança e mesmo depois de anos posso repetir a entonação da sua frase quando perguntou se eu estava sozinha e se queria ficar com você, esquecedo de me contar que estar contigo era estar rodeada de incertezas, porque sempre foi medroso demais para se jogar ao meus pés e se deixar atropelar por um corpo em brasa ou para equilibrar meu coração na palma da mão e chupar meu sexo ao mesmo tempo. Você não sabia, mas eu sempre gostei de ser vertigem. E você era só um fraco agarrado ao meu corpo como se fosse sua última salvação. Eu não era, baby. Era só uma alucinação com dia e hora marcados para desaparecer. Como toda vertigem deve ser]

4 comentários:

  1. When I find myself watching the time
    I never think about all the funny things you said
    I feel like it's dead
    Where is it leading me now.
    Piano In The Dark tocando na vitrola em uma noite de calor sufocante, sentado ao chão, onde fotos esparramadas me trazem lembranças, e talvez alguns lenços de papel e um inevitável copo com algo um tanto forte. Tem certeza de que você não está aqui, escondido atrás da cortina? Que droga, eu preciso te odiar!!!
    Eu preciso matá-lo, lá dentro...de mim, e tomar um banho gelado, pra esfriar meu corpo e deixar suas marcas na minha alma escorrerem pelo ralo. Reminiscências me fazem triste, e numa sexta feira à noite isso não é bom, nada bom. Por favor, alguém desligue esse piano. Que o sâbado traga o sol e me ilumine um pouco, pois amanhã sera apenas outro dia.
    Beijo moça

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  2. Pensando, hoje faz um lindo sábado ensolarado. Não se preocupe, o texto é antigo. E é ficção.

    =***

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  3. Grã, "ocupo-lhe a boca com meus pensamentos famintos, ela me engole e some."

    [Isso foi MUITO bom!]

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[Suas Pegadas]