segunda-feira, 1 de outubro de 2012

[Trabalho De Campo]

Querido Diário, 

Comecei a reparar que naquele dia, em especial, até que ele estava bonito. Embora não seja exatamente o tipo de homem que chame minha atenção, naquela manhã ensolarada ele estava realmente bonito. E por que, não é verdade? Era só um trabalho de campo, com direito a caminhada na floresta e, céus, uma roupa confortável, um tênis e tudo bem, ele estaria pronto. Lá estava o sujeito, entretanto, tão confortável dentro da sua existência atraente demais para um trabalho de campo numa manhã ensolarada no meio da floresta que, em determinado momento, olhei para o Cristo e blasfemei "que provação, oh, pai". Em pensamento, é claro, porque não sou boba nem nada. Enquanto a coisa toda se desenrolava, pessoas tiravam fotos - nunca entendi o funcionamento do cérebro de uma pessoa que gosta de tirar fotos de si mesma, repetindo ângulos e sorrisos como se não houvesse amanhã, ou outros ângulos possíveis, uma trilha repleta de folhas caídas, por exemplo, tão merecedora de um click mas, mesmo assim, esquecida sob os pés narcisistas das pessoas que só guardam para a posteridade fotos repetidas dos seus próprios ângulos repetidos. Ai, como as pessoas me cansam. E suas fotografias. E seus ângulos. Já falei que ele estava especialmente bonito no meio das pessoas e suas fotografias? Dias depois, ao ver as fotos daquela manhã, percebi algo: em todas aquelas em que nós dois aparecíamos, lá estava ele, olhando para mim. Não eram muitas - parece que compartilhamos a mesma antipatia por câmeras fotográficas -, mas o suficiente para me deixarem pensativa. Era só um trabalho de campo, com direito a caminhada na floresta e, céus, imagine uma roupa confortável, um tênis e tudo bem, eu estava pronta. E ainda tinha o calor. E minha pressa ao sair de casa, que me fez esquecer de levar qualquer coisa que prendesse meu cabelo. Então, sabe, eu dava nós no coitado, um após o outro, numa evidente tentativa de não morrer de calor e ser o menos atraente possível aos olhos de um homem que estava bonito demais para uma manhã como outra qualquer. E ele olhava para mim. Começo a juntar as peças e, mais cedo ou mais tarde, vou concluir que sou levada a sério. Se ele só desconhecesse o fato de que, quando vamos tirar uma fotografia, devemos olhar para a câmera e não para colegas de trabalho, estaria tranquila. Eu poderia ser mais uma que ele gostaria de levar para a cama e só. Porém, se ele já me chamou para concorrer, na sua chapa, a um alto cargo no trabalho, só me resta pensar que sou levada a sério demais. E uma pessoa que me leva a sério, enquanto estou caminhando no meio do mato e pensando "hummm, fazer sexo selvagem encostada naquela árvore ali cairia bem", vamos combinar, não pode ser levada a sério, Diário.