sábado, 8 de outubro de 2011

[A Mais Maneira Da Cidade]

O negócio aconteceu assim: estava lá, tirando inspiração do meu útero para conseguir a atenção de todos, já nos últimos instantes do expediente da semana quando, de repente, notei uma movimentação estranha de braços, mãos e lábios na minha frente. Tal movimentação acabou chamando minha atenção, principalmente porque envolvia um pedaço suspeito de papel que, sorrateiramente, passava de mão em mão.

Eu já estava muito puta da vida por causa do calor, porque meu esmalte tinha acabado de descascar, porque não consegui comprar ingressos para uma partida de futebol, porque as pessoas são más, porque minha caneta vermelha tinha feito sua passagem, porque o mundo é cruel, porque eu tinha muita coisa para corrigir e, céus, com esse calor, concentração é artigo de luxo, porque meu inferno astral está se espalhando sobre minha pessoa, porque eu queria comer para esquecer e comer sem engordar, porque eu não acho o botão desacelere no meu corpo, porque meu cabelo havia amanhecido uma maravilha da natureza e eu não tinha muito do que reclamar e, puxa, eu estava muito puta da vida por ser assim, do jeito que eu sou.

Interceptei o papel no momento em que ele ia trocar novamente de mãos, já imaginando pelo menos quatro opções diferentes de punições para aquela brincadeirinha. Abri o papel. Li o conteúdo. Desisti. Eu já estava muito puta da vida mesmo e, afinal de contas, descontar no meu semelhante a árdua tarefa de ter que lidar comigo mesma é algo que, definitivamente, não se faz.

Ah, sim. O papel:

[Ainda tenho cinco anos e fico felizinha com mais um título conquistado com todo o meu esforço, carinho e dedicação em ser, nesta vida, eu]

Nenhum comentário:

Postar um comentário

[Suas Pegadas]